{parte 1}
{parte 2}
{parte 3}
{parte 4}
A ver se a gente se entende... {isto é para quem, tendo lido os textos anteriores, ande um pouco baralhado com a coisa} Só para dar aqui um enquadramento. Tipo atenuante, topam? Eu sou benfiquista. E, a meu ver, quando se é benfiquista não há necessidade de se torcer pela Selecção Nacional, não faz sentido sequer. E olhem que não sou, nem de longe nem de perto, o único a achar isto. Um benfiquista está escusado dessa obrigação, dessa tarefa. Os desejos mais básicos, a torção das mais elementares noções de civilidade, as enormidades, as lágrimas contidas, os esforços, a pertença a um bem maior, a comunhão, todas essas funções estão a cargo do Benfica, são supridas pelo SLB, tudo isso faz parte do reino do Glorioso. O Glorioso chega e sobra {e percebo que seja aqui nesta verdade incontornável que resida o incómodo de tanta gente... lol}.
Mas isto digo-o agora, já mais crescidinho, mas nem sempre foi assim. Quer dizer, sempre torci por outros países mas nem sempre me desculpei com o Glorioso... Mas também não preciso, pois, e isto é constante, para mim, o apoio que eu reservo a uma selecção de um país é um jogo, sempre foi, é uma curte, uma dedicação a um outro algo mais. Eu quando torço por uma selecção, torço por agradecimento. Por reconhecimento. Por admiração. Não por obrigação. Não porque tenho um BI de nacionalidade portuguesa. Não por votar aqui no burgo. Não por pagar aqui impostos, não por meter aqui o IRS {não é assim Zazie?}. Muito menos por ser grátis {como agora tão miseravelmente se apregoa...}. Desde cedo, desde sempre, que torço por selecções que não a nacional. Eu, se tiverem lido os textos anteriores saberão, já torci por 4 selecções. Se as primeiras duas foram, mais ou menos, o correspondente ao primeiro desgosto de amor {Brasil} e ao primeiro namorico tão descarado quanto fugaz {Escócia}, já as duas seguintes foram, sem dúvida, o equivalente à primeira paixão fogosa {França} e a uma relação estável, madura e duradoura {Holanda}. E quando digo torcer, quero dizer torcer. Quero dizer saber os nomes dos jogadores, acompanhar nos media sempre que possível {o que em Portugal é extremamente difícil, diga-se; visto que o umbigo nacional é tão grande, tão grande que mal dá para ver o resto...; mas actualmente, graças a Deus, existe a internet...} o percurso da mesma, vestir uma camisa, ter um chacecol, the works... E chorar, ah, sim, chorar também acontece{u}. Mas como dizia, quando apoio uma selecção, o que eu apoio, o que eu procuro, o que me satisfaz, é o estilo, são as cores, os equipamentos, a personalidades dos jogadores, o peso da história, as nações em calções, percebem?, e sobretudo a ideia de que tudo é possível, de que apoio quem me dá na gana, quem me toca, quem me ensina. Que apoio um pouco além do futebol em si, numa espécie de troca com valor acrescentado.
Também é verdade, tenho de o admitir, que também o faço, em parte, por gozo, por provocação, por pirraça. Pois quando torço por uma outra selecção, não estou a torcer pela selecção portuguesa, não é? Mas como poderia? Sim, como poderia torcer {e pegando na actualidade} por Scolari {bom, este parece que já partiu...} e Madaíl?! Sim, quando alguém torce por Portugal está a torcer por Madaíl. Não se iludam. É assim que vejo a coisa. E isso basta-me, impede-me de criar empatia. Não há bonds que resistam nesta salganhada que é a selecção nacional... Só o termo – selecção –, safa, não é feliz, pois não? Parece um excerto de uma qualquer promoção Pingo Doce... E quando não são os dirigentes o problema, logo, logo, os jogadores se encarregam de deixar mal o país... Basta lembrar João Pinto na Coreia, não vou mais longe, nem mais perto. Não vou mesmo. Podia ir, acreditem, mas não vou.
Fico-me antes pela minha incapacidade de abstracção. Sim, aí, confesso, sou muito pouco português {se é que isso é uma característica nacional... a mim vêm-me outros termos à mente}. Ao contrário da maior parte dos meus compatriotas não sou capaz de passar um ano inteiro a dizer mal disto {ah, isso sim, é uma verdadeira característica nacional...} e depois, de dois em dois anos, poisar o cutelo e vestir a camisola. Não consigo. Não faz sentido. E visto o dilema em termos futebolísticos ainda mais difícil é. Senão vejamos. Como é possível estar-se um ano inteiro do outro lado da barricada, escutando as suas {FCP, SCP, etc.} invectivas e assistindo {hélas} às conquistas sucessivas e, depois, out of the blue, sob um absurdo pretexto de nacionalidade, de gregarismo obtuso, acarinhá-los e adoptá-los como meus representantes?! Estão doidos? Essa é uma habilidade, será um dom?, que não possuo. Lamento, aí não consigo chegar. É defeito meu mesmo. Como torcer por uma equipa que tem Meireles lá dentro? Estão loucos!? É que não dá mesmo para me abstrair. Antes pelo contrário. Quando vejo Scolari socar um jogador após um jogo {e como se não bastasse}, o que vejo são camionistas raivosos em vigília a incendiar pneus. Quando vejo Deco a cavar faltas com aquela manha tão apreciada por estes lados {e como se não bastasse}, o que vejo são mulheres histéricas, descontroladas, espumando, em redor dos tribunais. Quando vejo Ricardo choramingar entredentes {sim, o Ricardo chora pela boca...} o que vejo são milhares e milhares e milhares à torreira do sol, no santuário de Fátima. Quando oiço as intervenções de Madaíl {e como se não bastasse}, o que vejo são Audis em excessivo excesso de velocidade a caminho de uma morte qualquer. Como vêem, tenho dificuldade em me abstrair de certas coisas. Quando torço pela Holanda estes cenários miseráveis {que, estou certo, também devem assolar muitos holandeses; não fossem eles um dos povos mais refilões que conheço...} não ganham forma. Pois, como diz o outro, ignorance is bliss. Assim satisfaço-me com a elegância, o estilo, a energia, a mestria e o raciocínio dos países baixos. Mas, poderiam adiantar alguns de vós, porque não ver o génio de Fernando Pessoa nos zigue-zagues de Cristiano Ronaldo? Como? Sim, como? Vejam. Uma das boas memórias que guardo da elftal aquando do Euro2004 é, não um, nem dois, nem três, mas um porradão de jogadores holandeses a falarem em português para os jornalistas. Em português, senhores! Não em holandês, inglês ou espanhol, não. Em português! Um fenómeno destes poderia dar para ver Pessoa num jogador, mas em Ronaldo só vejo o célebre Evaristo; de que filme a preto e branco, como o país, era?. Isto é, e como não poderia deixar de ser num país de merceeiros, quando ele fala só oiço cifrões, negócio, lucro. E desde que continue a proferir, frase sim, frase não, «sou um privilegiado», tudo fica bem, tudo se apazigua. É a célebre castidade lusa.
Talvez um dia eu consiga vir a torcer por Portugal num qualquer campeonato de futebol. Quem sabe? Seria uma vitória para mim, conseguir fazer algo que agora não consigo, certo? Talvez um dia. Talvez quando a minha costela Domingos Calabar {imagem aqui} deixar de achar que se fôssemos um pouco mais Holanda tudo seria melhor... Talvez quando isso já não for importante para o país, nem para os portugueses. Até lá fico-me com aqueles que me ajudam a domar estes instintos básicos que poderiam fazer de mim um fervoroso adepto de Pepe...
Há 10 anos
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