segunda-feira, julho 07, 2008

Madre Ingrid de Bogotá

Eu sempre que pude acompanhei com sincero interesse as desventuras de Ingrid. Com tanto interesse quanto desconfiança, devo confessar. Há na mulher, para mim, algo dúbio, pouco exacto. O que não é um problema, na realidade. Mas sempre houve algo que me intrigou na sua trajectória, na sua postura. Após ter lido o "Spécial Ingrid Betancourt" na edição de ontem do Le Monde, acho que finalmente percebi a razão, a origem da minha desconfiança, do meu torcer de nariz. O que me incomoda em Ingrid é a sua ligação religiosa com o mundo, com a vida. É que ela é uma menina, uma betinha, nada em boas famílias colombianas, uma tipa dedicada, recta, com moral definida, culta, formada nas Sciences Po parisienses, que conquistou um lugar digno e bem conquistado no espectro político colombiano, mas que, apesar de tudo isto, ou por tudo isto, me parece refém de uma postura um pouco a puxar à la Madre Teresa de Calcutá, numa reinvenção da dita senhora numa espécie de Madre Ingrid de Bogotá.
Não me é difícil imaginar o quão terrível, árduo, exasperante, revoltante, e sei lá mais o quê, poderá ser a experiência de sobreviver na selva, rodeada de animais {e refiro-me a todos os que por lá andam, naturalmente}, separada do seu mundo, das suas cores, cheiros e sentidos em geral. Uma experiência deste nível só pode, deve, dar-nos que pensar, obrigar-nos a colocar as coisas em perspectiva, reflectir nos poderes superiores, equacionar misticismos e religiosidades vários. Mas a mim parece-me pouco, surpreende-me, que após seis anos de cativeiro nestas condições adversas a solução final, isto é, a procura do conforto e agradecimentos finais, passe por ir «à la chapelle de la Vierge miraculeuse de la rue du Bac à Paris, et aussi à Lourdes et au Vatican...».
Nada tenho contra, por amor de Deus, isto é mesmo uma cena meramente pessoal, mas sinceramente acho pouco, esperava algo {refiro-me ao rescaldo} um pouco mais visceral e menos vestal, um pouco mais cidadã do mundo e menos uma cena, quase doméstica, franco-colombiana. Eu admiro a mulher, respeitei sempre a sua dor, exalto a sua libertação, mas não deixo de pensar como me parece agora cada vez menos interessante a sua provável {?; e será interessante acompanhar o futuro imediato} incumbência do cargo de Alvaro Uribe, o homem que curiosamente ocupou o lugar que lhe parecia destinado a ela em 2002.
Uma novela a acompanhar. Vêem? É disto que me queixo...

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