quarta-feira, setembro 05, 2007

FC Start

No Verão de 1941, na sequência da Operação Barbarossa, a Ucrânia (o celeiro da Rússia) iria mudar de mãos. O avanço repentino e devastador da Wehrmacht (seguida pelos infames Einsatzgruppen) tomou (não sem resistência, diga-se) a Ucrânia e a sua capital Kiev. Este movimento histórico interrompeu (entre muitas outras coisas) a carreira fulgurante de uma das mais carismáticas equipas de futebol da esfera soviética, o Dínamo de Kiev. País devastado, capital tomada, população subjugada. Ponto final. Mas em 1942, precisamente um ano depois, após mil e uma peripécias pessoais, na Padaria n.º 3 de Kiev, as circunstâncias da vida reuniram de novo vários jogadores do Dínamo, bem como alguns do rival Lokomotiv. Juntos, rivalidades à parte, e após decisão dos novos poderes da cidade (que assim julgavam poder restaurar uma certa normalidade na cidade deprimida), puderam formar uma nova equipa - o FC Start - e jogar uma dúzia de jogos (numa espécie de torneio estival) que culminaram naquele que ficou conhecido como o Jogo da Morte. Homens como Klimenko, Trusevich, Kusmenko e Goncharenko puderam de novo fazer aquilo que melhor sabiam fazer, jogar futebol. Jogo após jogo, esta nova equipa foi esmagando adversário atrás de adversário (e na passada fazendo resurgir uma união e esperança já perdidas entre a população de Kiev) até ao momento em que o comando alemão resolveu colocar um ponto final na história (que os ânimos estavam já demasiado agitados), convocando o FC Start para um jogo decisivo e definitivo (pensavam eles) frente ao Flakelf, uma equipa oriunda das fileiras da Luftwaffe. Embora frente a uma equipa saudável e bem alimentada, o FC Start venceu calmamente por 5 a 1, humilhando as forças ocupantes. Que marcaram novo jogo, para dias depois. Uma vez mais o FC Start venceu (5 a 3), não cedendo às múltiplas pressões a que foi sujeito (para que perdesse). O jovem Klimenko foi mesmo longe demais ao negar-se a marcar um golo, após ter passado defesas e guarda-redes, parando a bola sobre a linha de golo e, voltando-se, repondo a bola em jogo! Humilhação das humilhações. Dias depois encontravam-se, a maior parte deles, de novo, mas desta vez no campo de concentração de Siretz. Ali morreram alguns (nas mãos do sádico Radomsky). Outros sobreviveram à guerra. Alguns ainda voltaram ao mundo do futebol. Outros permaneceram no anonimato, sob uma nova mão pesada. Mas todos eles são ainda hoje relembrados na Ucrânia como verdadeiros heróis. À porta do Estádio Zenit encontra-se ainda hoje um memorial representando Korotkykh, Trusevich, Kusmenko e Klimenko, os heróis caídos em Siretz. Esta "pedra" ainda até há bem pouco tempo (não sei se ainda o fazem) era local obrigatório durante as festividades dos casamentos dos jogadores do Dínamo, numa sentida homenagem. A minha fica expressa nestas palavras. FitzkulHurra!















A equipa do primeiro jogo. [Clicar para aumentar e ler legenda]





















O monumento no Estádio Zenit.


Isto após ter lido o livro Futebol e Guerra. Resistência, Triunfo e Tragédia do Dínamo na Kiev Ocupada pelos Nazistas, de Andy Dougan (Jorge Zahar, 2004). Não é um livro lá muito bem escrito, mas a história é fascinante. E, sim, parece que o filme Fuga para a Vitória é largamente inspirado nesta história fantástica.

2 comentários:

Renan disse...

ótimo post! meu parabéns.
o filme é de 1981, não seria o livro inspirado no filme?
abraços!

anauel disse...

Caro Renan,

Obrigado por aquele que acredito ser o comentário mais retroactivo deste blog... (lol) e pelo elogio.

Mas eu disse que o filme era inspirado na história, não no livro. Ambos são inspirados na realidade, e essa data dos anos 40...

abraços!